Wednesday, December 14, 2005

Entrevista com Robert van Dijk (BRAM)

Matéria publicada no Valor Econômico de 14 de Dezembro.

Renda fixa ainda é a estrela para a Bram
Por Danilo Fariello De São Paulo

Responsável pelo destino de R$ 103 bilhões de investidores de todo o Brasil, o diretor superintendente da Bradesco Asset Management (Bram) Robert John van Dijk vive diariamente um desafio: conciliar estilos de gestão que atendam desde o grande grupo empresarial até o pequeno aplicador, que confia ao maior banco privado do país suas preciosas economias. São 3,4 milhões de cotistas e 434 fundos, além de 107 carteiras administradas. Eleito duas vezes pela revista ValorInveste como um dos melhores gestores do mercado brasileiro em ranking elaborado pela Standard & Poor's, van Dijk acredita que mesmo com a queda prevista do juro nominal em 2006 o investidor brasileiro deverá manter a maior parte de seus recursos na renda fixa. Porém, ele prevê bastante volatilidade nos mercados pelas eleições presidenciais, o que abriria espaço para oportunidades de maior risco.
Constituída em abril de 2001, a Bram é uma das duas gestoras brasileiras com classificação de risco MQ1 da Moody's, a nota máxima. A seguir a entrevista exclusiva de Van Dijk ao Valor.

Valor: O que esperar do mercado financeiro no próximo ano?
Robert John van Dijk: Prevemos que 2006 será novamente um ano marcado por muita volatilidade dos mercados, principalmente por causa das eleições. Mas temos também muita atenção na evolução da economia americana, que tem de controlar seus déficits fiscal e comercial. Esperamos, por exemplo, uma elevação dos "fed funds", a taxa de juro de curto prazo do mercado americano, para algo entre 4,75% e 5% ao ano no fim de 2006. Isso quer dizer um rumo suave no ajuste, que não causará impacto tão forte na liquidez internacional e, portanto, na economia brasileira. Mas essa mudança na economia americana e, principalmente, a evolução da corrida à eleição presidenciais dão espaço para especulações e volatilidade do mercado, criando oportunidades boas a quem queira correr riscos.

Valor: Qual sua expectativa quanto ao rumo da taxa de juros?
Van Dijk: Esperamos que a taxa de juros nominal continue a cair e encerre 2006 entre 15% e 16% ao ano. Com isso, devem haver também redução dos juros reais (descontada a inflação).

Valor: Esse corte abalaria a preferência pela renda fixa?
Van Dijk: Ainda não. No ano que vem, o juro será menor, mas ainda num nível alto. O juro real deverá permanecer acima de 10% ao ano, o que, não existe em nenhum outro lugar do mundo. Para perfis conservadores, esses retornos, ainda são bastante expressivos. É um ganho confortável, com risco bastante baixo. Portanto, a renda fixa deve fazer parte da maior parcela da carteira de qualquer investidor no Brasil por algum tempo ainda.

Valor: Mas com juro real menor, quem quiser manter o rendimento vai ter de correr mais riscos...
Van Dijk: Realmente, ficamos mal-acostumados a ter rendimento real alto, com baixo risco. Mas, antes de se lançar a investimentos mais arriscados, é preciso ponderar objetivos e apetite a riscos, além de considerar também quanto os recursos expostos a maior risco pesam no patrimônio. Maior retorno com menor risco possível é o que todos querem, mas essa está longe de ser uma receita simples.

Valor: Seria o momento de diversificar buscando investimentos atrelados a índices de inflação?
Van Dijk: À medida que há expectativa de queda do juro real, aumenta a atenção sobre essas aplicações. Atualmente, podemos encontrar papéis atrelados ao IPCA e ao IGP-M com vencimento num horizonte de três a cinco anos com juros bastante interessantes. Esses papéis começam a ser objeto de análise de nossos gestores.

Valor: O momento continua interessante para a bolsa?
Van Dijk: Independentemente do cenário econômico, provavelmente sempre haverá determinadas empresas que irão bem na bolsa. Por isso, pode-se imaginar que, tendo uma gestão ativa, é possível sempre ter bons resultados em ações. Há momentos em que a economia interna não vai bem e, portanto, empresas focadas no mercado daqui também não vão, como ocorreu em 2002. Mas, naquele momento, empresas exportadoras, como dos setores de papel e celulose e siderúrgicas, tiveram boa valorização. Mas, antes de aplicar, o investidor tem de assumir o risco de entregar seus recursos e confiar no gestor, que decidirá quais ações vão para o fundo.

Valor: Quais os setores que devem despontar em 2006?
Van Dijk: O superávit fiscal próximo de 5,5% do PIB neste ano significará um excedente de recursos que deverá ser injetado na economia e poderá sinalizar aquecimento maior do mercado interno. Empresas voltadas ao mercado local, portanto, terão um bom ano. Esperamos observar um crescimento do PIB de 3,2% em 2006, o que também dará bom suporte ao avanço dessas empresas. Para as exportadoras, continuaremos com um aumento da corrente de comércio e um superávit comercial importante, mas menor do que este ano, de R$ 37 bilhões. Para este ano, nossa previsão é de superávit de R$ 43,5 bilhões. Porém, temos de acompanhar muito de perto o nível de investimento global no país, que vem caindo recentemente. Isso pode ser um freio à uma redução das taxas de juros e, conseqüentemente, afetar o desempenho das ações.

Valor: Investimentos em dólar não são recomendados?
Van Dijk: Não deveremos ter movimento forte no câmbio ao longo dos próximos meses. Nossa previsão é que, no fim de 2006, o câmbio esteja entre R$ 2,35 e R$ 2,45. Como esperamos que o câmbio encerre este ano entre R$ 2,20 e R$ 2,25, prevemos que a valorização do dólar frente ao real, portanto, não deverá superar a taxa de juros. Mas, para quem tem compromissos em dólar, fundos cambiais são sempre indicados. Para os investimentos em euro, a expectativa não é mais otimista.

Valor: A Bram tem proporcionalmente importância menor no segmento de fundos agressivos do que sua fatia total no mercado. Por quê?
Van Dijk: A Bram está pronta para atender seus clientes com praticamente todos os modelos do mercado. Mas o que verificamos é que as taxas de juros reais no Brasil são tão elevadas que os produtos de renda fixa atingem expectativas de um número grande de investidores. O que não quer dizer que, num portfólio ideal, não haja espaço para agregar investimentos mais agressivos, com mais risco, para que se busque rendimento superior a esses juros.

Valor: Mas com a redução do juro básico isso deve mudar?
Van Dijk: A participação da renda variável ainda é diminuta no setor de fundos. Mas, nesse cenário de queda dos juros - oxalá a taxa seja menor no futuro -, para agregar mais retorno, o investidor necessariamente terá de se expor a mais risco. Se a Selic realmente cair, acredito que a importância de fundos de ações e multimercados, mais agressivos, tenderá a crescer gradualmente, na Bram e no mercado como um todo.

Valor: Vocês não temem que investidores da Bram estejam procurando gestores especializados para aplicar seus recursos destinados a correr mais riscos?
Van Dijk: Nós já temos esses produtos agressivos na nossa prateleira. E, à medida que a demanda por eles crescer, nós tenderemos a acompanhá-la. Porém, isso não impede o desenvolvimento de gestoras de nicho, que atuam em mercados específicos, como derivativos. Há espaço para eles no mercado e na carteira de investidores. Especialização e diversificação são saudáveis para o setor.

Valor: Reconhecendo isso, alguns bancos no Brasil oferecem produtos de outros gestores. No Bradesco acontece isso?
Van Dijk: Há diferentes estilos de gestão entre os especialistas. Existem os fundamentalistas, os mais técnicos, aqueles que tentam acertar o tempo das diferentes viradas do mercado, aqueles que buscam retorno absoluto, entre outros. De repente, para os investidores, provavelmente a diversificação entre esses diversos estilos possa ser algo natural no futuro, com a evolução do setor. No segmento private do Bradesco, já oferecemos investimentos em outros gestores. Naturalmente, isso pode até vir a ser oferecido para os clientes de varejo de alta renda, do segmento Prime.

Valor: O que podemos esperar de novos produtos da Bram?
Van Dijk: Este ano houve um desenvolvimento forte no mercado dos fundos em direitos creditórios (FIDCs), dos long/short (arbitragem), dos de ações com pouca liquidez (small caps) e das carteiras de dividendos. Acredito que os fundos de ações são os que têm mais espaço para evoluir.

Valor: Recentemente, foi lançado o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) da bolsa. Vocês pensam em um fundo desse tipo?
Van Dijk: Indiscutivelmente, os valores éticos serão cada vez mais importantes no futuro. Um fundo que siga o ISE poderá ter boa procura ou talvez um fundo só de empresas com boa governança corporativa. Mas ainda não há novo fundo em fase avançada de formação.

Valor: Mais de 60% dos R$ 103,8 bilhões administrados pela Bram pertencem a pessoas físicas. Como é lidar com tanta gente?
Van Dijk: Investimos constantemente no treinamento de gerentes, para que sejam bons conselheiros financeiros. Eles têm de entender a demanda do cliente, para oferecer o melhor produto. Além disso, temos uma área que dá suporte para os gerentes.

Valor: Os investidores que há poucos anos estavam acostumados com rendimento polpudos da caderneta já sabem lidar com a complexidade dos fundos?
Van Dijk: Em geral, sim. Este ano tivemos mudanças importantes que trarão ainda maior transparência e eficiência ao setor, principalmente pela instrução nº 409 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Também tivemos mudanças tributárias, diferenciando investimentos de curto e longo prazos. Teremos, em outubro de 2006, a migração de todos os recursos para a conta-investimento, o que lhes dará mobilidade total. Com essas novidades, o setor de fundos tende a avançar ainda mais.

Valor: Qual sua visão do futuro dos fundos no Brasil?
Van Dijk: Acho que ficará cada vez mais importante a gestão ativa dos investimentos. É como na medicina. Muitas vezes, evitamos ir ao médico quando estamos doentes e, tomando antibióticos por conta, acabamos pagando caro e tendo efeitos colaterais sem garantia de cura. Se não vamos ao médico, também podemos ter algo mais grave. Da mesma forma, o aconselhamento profissional a investidores é importante e o será cada vez mais conforme o juro cair.

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